Nota de Imprensa
27 de setembro de 2024
“O
Movimento proTEJO mantém que o acordo ibérico deve assumir definitivamente a
urgência da implementação de um verdadeiro regime de caudais ecológicos no rio
Tejo”
O Movimento proTEJO teve
conhecimento dos princípios de acordo ibérico sobre gestão dos rios
transfronteiriços comunicados pela senhora ministra Maria da Graça Carvalho em
conferência de imprensa, após a reunião realizada com a ministra Teresa Ribera,
no Palácio Real de Aranjuez, Espanha, que está previsto ser assinado na próxima
cimeira ibérica, a realizar-se no dia 23 de outubro, em Portugal.
Este Movimento considera de todo
apropriado que a senhora ministra do Ambiente e da Energia aproveite o período
que agora irá decorrer até à assinatura do acordo no dia 23 de outubro para auscultar
as organizações e movimentos
cívicos que lhe dirigiram uma carta aberta para conhecerem os termos do acordo
ibérico, no passado dia 10 de setembro.
Reiteramos ainda a nossa vontade de reunir
com a senhora ministra do Ambiente e da Energia para
nos pronunciarmos sobre os termos que farão parte deste acordo ibérico, entre
outros assuntos, solicitação que já tínhamos comunicado há 10 dias atrás, no
dia 16 de setembro.
Felicitamos as declarações da senhora ministra
Ambiente e da Energia, Maria da Graça Carvalho por assumir a existência de um
problema de enorme volatilidade dos caudais do rio Tejo com origem em Espanha, a
necessidade de estabelecer caudais diários que permitam a conservação dos
ecossistemas e a clarificação de que não podem existir momentos de caudais
nulos no rio Tejo.
Apesar do sentido positivo destas
declarações, o movimento proTEJO teria ficado satisfeito se, em vez de caudais
diários, se tivesse assumido definitivamente o conceito de caudais ecológicos.
Desejaríamos ainda compreender a razão
pela qual se continuam a fixar caudais mínimos, politica e administrativamente,
sejam eles diários, semanais, trimestrais ou anuais, enquanto se mantém suspenso
o articulado principal da Convenção de Albufeira, no seu artigo 16º, que estabelece
a necessidade de implementação dos caudais necessários à conservação dos
ecossistemas e do bom estado ecológico das massas de água, vigorando transitoriamente
um regime de caudais mínimos constantes do protocolo adicional a esta Convenção,
em incumprimento da Diretiva Quadro da Água.
O regime de caudais ecológicos, que pretendemos
ver implementados definitivamente, são aqueles verdadeiramente permitem a
conservação dos ecossistemas e o bom estado ecológico das águas e que, sendo
instantâneos e contínuos, evitam por essa via a enorme volatilidade de caudais
que hoje se verifica e que prejudica os ecossistemas, as atividades económicas
e o usufruto do rio pelas populações.
Consideramos assim incontornável que o
acordo ibérico consagre um verdadeiro regime de caudais ecológicos no rio
Tejo que preencha todas as condições e elimine os problemas causados pelo atual
regime de caudais mínimos, conforme foi corretamente enunciado nas declarações
da senhora ministra do Ambiente e da Energia.
É ainda imperativo que não se desperdice esta janela de oportunidade, exigindo a implementação de um verdadeiro regime caudais ecológicos, fazendo disso depender a autorização à Iberdrola para construir os dois projetos hidroelétricos de bombagem reversível nas barragens de Alcântara e Valdecañas no rio Tejo, visto que o projeto de Alcântara necessita da autorização das autoridades portuguesas no âmbito da Convenção de Albufeira, por se localizar a menos de 100 km do território português.
Com
efeito, a implementação destes dois projetos hidroelétricos de bombagem
reversível permitirá à concessionaria hidroelétrica manter a água em ciclo
fechado durante mais tempo gerando um enorme incremento da capacidade de
armazenamento de água e de produção de energia.
Por
estes motivos existirá então uma margem suficiente para libertar a água
necessária a um verdadeiro regime de caudais ecológicos destinados à conservação
dos ecossistemas e ainda caudal suficiente para os usos económicos e de lazer
das populações ribeirinhas.
Assim, reivindicamos que a senhora ministra do Ambiente e da Energia contribua
para inverter esta situação de passividade intolerável perante as questões
ecológicas exigindo a implementação de um regime de caudais ecológicos que
adote o conceito de regime de caudais ecológicos atualmente em vigor e muito
bem estabelecido no Plano Nacional da Água
2002,
como sendo o:
“regime de caudais necessário para
garantir o bom estado das águas, no sentido de minimizar os impactes sobre os
ecossistemas dulçaquícolas a jusante dos aproveitamentos hidráulicos, que
permitam assegurar: a conservação e manutenção dos ecossistemas aquáticos
naturais; a reprodução das espécies; a conservação e manutenção dos
ecossistemas ripícolas; e os aspetos estéticos da paisagem ou outros de
interesse científico e cultural” especificando-se:
a) Caudais instantâneos, definidos à escala
mensal, que variam ao longo dos anos para atender às necessidades das espécies
aquáticas;
b) Flexível em função das
condições hidrológicas naturais que se verificam em cada ano, em particular em
anos secos, devendo ser definidos regimes de caudais ecológicos para anos secos
e para anos médio e húmidos;
c) Caudais de cheia para:
i. Remoção de materiais finos depositados e prevenção do
crescimento da vegetação;
ii. Manutenção da estrutura do leito e das secções transversais;
iii. Manutenção da zona ripária, leito de cheia, características do
vale e nível freático;
iv. Manutenção dos ecossistemas associados aos cursos de água, tais
como zonas húmidas e estuários.
Este Movimento
considera que o rio Tejo precisa urgentemente de um verdadeiro regime de
caudais ecológicos determinados por métodos científicos, que contribua para o
bom estado ecológico das massas de água e para a conservação dos ecossistemas
ribeirinhos e não apenas caudais mínimos diários, anunciados através da
comunicação social em julho, que iriam ser acrescidos aos caudais mínimos (não são ecológicos) semanais, trimestrais
e anuais fixados, política e administrativamente, na Convenção de Albufeira.
Importa que seja clarificado que um
verdadeiro regime de caudais ecológicos não se coaduna com a proposta de
caudais mínimos diários avançados pelos seus antecessores no gabinete do
Ambiente, fazendo simplesmente a divisão dos atuais 7 hm3 de caudal mínimo
semanal pelos 7 dias das semanas, ou seja, 1 hm3 por dia a serem largados à
hora que muito bem desejasse a concessionária hidroelétrica espanhola.
Este conceito repete a fórmula absurda acordada
em 2017, entre o Governo português e a concessionária hidroelétrica EDP que
fixou um caudal mínimo diário na barragem de Belver de cerca de 0,864 hm3[1] que se
alcançam turbinando 30 m3/s de água em dois períodos de 4 horas, sendo que
durante as restantes 16 horas do dia podem manter-se caudais nulos.
Demonstrando-se assim que um caudal diário não é um verdadeiro caudal
ecológico, contínuo e instantâneo, mas apenas um caudal mínimo com o objetivo
de servir principalmente a produção de energia.
A situação atual exige uma demonstração
inequívoca de responsabilidade de ambas as partes de modo a assegurar que o
Estado Português, através da Senhora Ministra do Ambiente e da Energia, não
repita o recurso a soluções apressadas de carácter vincadamente economicista de
caudais mínimos diários.
Tememos o arrastar de uma situação de
submissão exclusiva aos interesses economicistas em detrimento do primordial
interesse da Sustentabilidade da Vida que é do interesse de todos pois sabemos
quão urgente é enveredar por uma ação responsável e dirigida, para contrariar o
crescendo de disfuncionalidades observadas nos ecossistemas pondo em causa a
sobrevivência.
Lembramos que a denúncia à Comissão Europeia devido ao “Incumprimento da
Diretiva Quadro da Água pela não implementação de um regime de caudais
ecológicos por Espanha e Portugal” já foi subscrita por um conjunto de 31 organizações
portuguesas, espanholas e europeias, ambientalistas, sociais, culturais e
autarquias, e que a defesa da implementação de um regime de caudais
ecológicos foi ainda acompanhada pelas comunidades intermunicipais do Médio
Tejo, Lezíria do Tejo e Beira Baixa, faltando a solidariedade da Área
Metropolitana de Lisboa (AML) e dos seus municípios para com aqueles situados a
montante do rio Tejo.
Mantemos a nossa defesa
de um regime de caudais ecológicos na barragem de Cedillo no rio Tejo,
determinados cientificamente nos Planos de Gestão da Região Hidrográfica de
Portugal e Espanha, com a coordenação das administrações de Portugal e Espanha,
dando cumprimento à Diretiva Quadro da Água e ao direito europeu,
em conformidade com a legislação nacional de Portugal e Espanha e com a própria
Convenção de Albufeira celebrada entre Portugal e Espanha.
Bacia do Tejo, 27 de setembro de 2024
Ana Silva e Paulo
Constantino
Os Porta-Vozes do
proTEJO
Mais informação: Paulo Constantino +351
919 06 13 30
[1] “Em concreto, foi estabelecido que o volume de água afluente a Belver seja turbinado, em dois períodos de 4 horas, fixando também um caudal mínimo diário de 10 m3/s, o que é equivalente a um volume diário de 0,864 hm3 para jusante.” Vide Caudais do rio Tejo 30-07-2021 - XXII Governo - República Portuguesa.