CARTA ABERTA
“AGRAVAMENTO DA POLUIÇÃO NO ESTUÁRIO DO TEJO GERA IMPACTOS
ECOLÓGICOS NEGATIVOS NA BIODIVERSIDADE, ELEVADOS RISCOS PARA A SAÚDE PÚBLICA E
SIGNIFICATIVOS PREJUÍZOS PARA A PESCA DE BIVALVES”
14
de abril de 2021
Exmo. Senhor Ministro do Ambiente e da Ação Climática
João Pedro Matos Fernandes
Exmo. Senhor Presidente da Agência Portuguesa do Ambiente
Nuno Lacasta
Exmo. Senhor Inspetor-Geral da Agricultura, do Mar, do
Ambiente e do Ordenamento do Território
José Brito e Silva
O proTEJO – Movimento pelo Tejo teve conhecimento de um agravamento
da poluição microbiológica que está a deteriorar a qualidade da água do
estuário do Tejo, que pode ter diversas origens:
a) existência de focos de poluição no troço principal do rio
Tejo, onde se têm registado
episódios de poluição de espuma abundante desde Chamusca a Valada, nos passados
dias 7 e 9 de abril, que acrescem às situações de poluição de montante no açude
de Abrantes, nos passivos ambientais das albufeiras de Fratel e Belver, na
eutrofização do rio Pônsul e da barragem de Cedillo com origem em Espanha, que
temos vindo a comunicar desde junho de 2020.
b) ocorrências de poluição nos afluentes do rio Tejo, que reportámos no passado dia 6 de abril, com origem no
insuficiente tratamento de águas residuais das atividades urbanas, pecuárias e
industriais;
c) insuficiente tratamento das águas residuais urbanas na área metropolitana de Lisboa, explicação que não se
coaduna com os elevados investimentos realizados nas suas ETAR´s; e
d) passivos
ambientais da atividade industrial de
décadas anteriores na área metropolitana de Lisboa, que se depreende face aos elevados
teores de metais pesados, em particular o chumbo.
O Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) tem
como atribuições a delimitação e a classificação das zonas de produção de
bivalves tendo dividido o estuário do Tejo em 2 zonas de produção distintas,
uma localizada a jusante da Ponte Vasco da Gama (ETJ1) e a outra a montante da
Ponte Vasco da Gama (ETJ2), cuja classificação em termos de autorização
de apanha e de destino
tem apresentado grande variabilidade nos últimos anos devido às significativas alterações
dos níveis de contaminação microbiológica.
Apesar das estações de
qualidade não terem, aparentemente, dados
recentes relativos à qualidade microbiológica no estuário, os dados de
monitorização Sistema
Nacional de Monitorização de Moluscos Bivalves têm mostrado que os resultados das análises
microbiológicas em bivalves apresentam um agravamento das concentrações microbiológicas
em 2020/2021.
Com efeito, desde 9 de março
de 2021 que se encontra “Proibida” a captura de todos os bivalves na
do estuário do Tejo a montante da Ponte
Vasco da Gama (ETJ2), que integra a Reserva Natural do Estuário do Tejo a
partir da entrada do rio no estuário, sendo estes a lambujinha devido aos elevados
teores em chumbo, e a amêijoa-japonesa e o berbigão devido às elevadas
contaminações microbiológicas (Despacho nº
2625/2021, de 9 de março).
Figura. Classificação das zonas de produção
de bivalves no estuário do Tejo.
Fonte: Instituto Português do Mar e da Atmosfera
Esta contaminação microbiológica é um dos fatores de
classificação das zonas de produção que limita a apanha e o destino dos
bivalves, sendo que os bivalves
provenientes de zonas de classe B podem ser entregues em depuradoras e depois
vendidos ao consumidor final, após alguns dias de depuração, enquanto que
aqueles que são capturados em zonas de classe C só podem ser consumidos após
depuração prolongada (transposição) ou transformação industrial (cozedura ou
outras similares).
Contudo, em Portugal não existem áreas designadas como
zonas de transposição pelo que a comercialização dos bivalves provenientes
da zona de classe C está limitada à exportação para zonas de transposição em
Espanha visto que em Portugal não existe transformação industrial.
Por estes
motivos, a deterioração da qualidade da água no estuário do Tejo está a gerar impactos
ecológicos negativos na sua biodiversidade, a acarretar significativos prejuízos
para a atividade piscatória, em particular para a apanha de bivalves, e pode
conduzir a práticas com elevados riscos para a saúde pública.
A deterioração
da qualidade da água no estuário do Tejo está a causar prejuízos económicos a
cerca de 1.700 apanhadores de amêijoa-japonesa no estuário do Tejo (Ramajal et al., 2017) pelas suas consequências na “Proibição”
da captura de todos os bivalves na zona a montante da Ponte Vasco da Gama
(ETJ2) e nas limitações de apanha e destino na zona a jusante da Ponte
Vasco da Gama (ETJ1).
Mais grave ainda, a deterioração da qualidade da água no
estuário do Tejo pode conduzir a práticas com elevados riscos para a saúde
pública apesar da existência de proibição e de limitações de apanha e destino
dos bivalves capturados no estuário do Tejo.
A título de
exemplo, as capturas de amêijoa-japonesa efetuadas no estuário do Tejo em zona de
produção “Proibida” ou “destinados a transposição prolongada ou transformação
em unidade industrial” (Classe C) podem ser declaradas com origem no estuário
do Sado permitindo o seu encaminhamento para depuradoras visto que aí existe uma
zona de produção classificada como Classe B (ESD2, Estuário do Sado, Canal de
Alcácer).
Mediante a
dimensão e a gravidade da poluição do estuário do Tejo e face aos seus impactos
ecológicos negativos para a biodiversidade, aos elevados riscos para a saúde
pública e aos significativos prejuízos para a atividade de pesca de bivalves, o proTEJO vem requerer o seguinte:
a)
Que a Agência Portuguesa do Ambiente e a Inspeção-Geral
da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT)
promovam a identificação das origens da contaminação microbiológica e de metais
pesados que estão a deteriorar a qualidade da água do estuário do Tejo e tomem as ações
necessárias à sua eliminação, bem como procedam à responsabilização dos agentes
poluidores do estuário do Tejo, do rio Tejo e dos seus afluentes.
É imprescindível conhecer se esta poluição resulta
do insuficiente tratamento de águas residuais e de passivos ambientais
existentes na envolvente área metropolitana de Lisboa e/ou de ocorrências de
poluição a montante da bacia hidrográfica do Tejo, ou seja, com origem no rio
Tejo e nos seus afluentes.
b)
Que a Agência Portuguesa do Ambiente informe sobre as
medidas previstas para permitir que o estuário do Tejo alcance um bom estado
ecológico, nomeadamente, as que serão integradas no Programas de Medidas do 3º
Plano de Gestão de Região Hidrográfica para 2022/2027, em cumprimento da Diretiva Quadro da Água e das
Diretivas Europeias que regulamentam o tratamento das águas residuais e a
qualidade da água para os diversos usos, como sejam, os fins aquícolas e
piscícolas;
c)
Que seja reativada a “Comissão de Acompanhamento sobre a
Poluição do rio Tejo”, desativada em 2018, com o objetivo de delinear um “Plano
de melhoria da qualidade da água do estuário do Tejo”, congregando um trabalho conjunto entre a Agência
Portuguesa do Ambiente, a Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e
do Ordenamento do Território (IGAMAOT), o Instituto Português do Mar e da
Atmosfera, a Área Metropolitana de Lisboa, os municípios afetados, bem como as
organizações não governamentais de ambiente, as organizações representativas da
atividade piscatória e as instituições de investigação científica.
Bacia do Tejo, 14 de abril de 2021
Os Porta-Vozes do proTEJO,
Ana Silva, José Moura e Paulo
Constantino
Valada
rio Tejo
7 de abril
2021
Chamusca – rio Tejo
9 de abril de 2021