Carta Aberta ao
Senhor Ministro do Ambiente e da Ação Climática
13 de dezembro de 2022
proTEJO alerta para o projeto de bombagem para montante na barragem espanhola de Alcântara e requer que o Senhor Ministro do Ambiente e da Ação Climática exija a implementação de caudais ecológicos na barragem de Cedillo no rio Tejo
O proTEJO – Movimento pelo Tejo vem alertar o Senhor Ministro do Ambiente e da Ação Climática, Duarte Cordeiro, para o lançamento do processo de consulta pública do pedido de autorização administrativa prévia e declaração de impacte ambiental do anteprojeto de execução de uma central de bombagem hidráulica reversível da IBERDROLA, com o objectivo de estabelecer a bombagem de água para montante na barragem de Alcântara no rio Tejo, na província de Cáceres, em Espanha[1] - vd. Anexo nº 1.
Este projeto esteve em consulta publica até 19 de junho de 2020 em Espanha[2] tendo o proTEJO requerido ao Ministério do Ambiente e da Ação Climática, em 31 de março de 2021, a devida prestação de informação sobre o projeto às populações ribeirinhas e sobre os previsíveis impactos no rio Tejo em Portugal. Requereu-se ainda a manifestação da oposição ao projeto por parte do Ministério do Ambiente e da Ação Climática no âmbito do quadro de cooperação da Convenção de Albufeira para a “proteção das águas superficiais e subterrâneas e dos ecossistemas aquáticos e terrestres deles diretamente dependentes e para o aproveitamento sustentável dos recursos hídricos das bacias hidrográficas”.
Aprovechamiento Hidroeléctrico de José María de Oriol II
Trata-se de um projeto que, em função da sua natureza, dimensão e localização, deve ser submetido a avaliação de impacte transfronteiriço, assim como desenvolvidos os procedimentos que devem basear essa avaliação, conforme determinado pelo artigo 9º e Anexo II da Convenção de Albufeira (Ver Caixa – Convenção de Albufeira).
A concretização deste projeto agravará significativamente a disponibilidade e variabilidade de caudais no rio Tejo em consequência da restrição da água que flui para o rio Tejo em Portugal a partir de Espanha, não sendo de esperar mais do que o volume limite de caudal mínimo de 2.700 hm3, e talvez mais uma gota, para cumprir formalmente a Convenção de Albufeira, à semelhança do que aconteceu nos poucos anos de seca que assolaram o rio Tejo (Ver Caixa – Caudais do rio Tejo).
Assim, o proTEJO tem vindo a defender que, na bacia hidrográfica do Tejo, devem ser estabelecidos caudais ecológicos regulares, contínuos e instantâneos, medidos em metros cúbicos por segundo (m3/s), e respeitando a sazonalidade das estações do ano, ou seja, maiores no inverno e outono e menores no verão e primavera, por oposição aos caudais mínimos negociados politicamente e administrativamente há 24 anos na Convenção de Albufeira sem se concretizar o processo de transição para o regime de caudais ecológicos que essa mesma Convenção prevê – vd. Anexo nº 2.
O não estabelecimento de caudais ecológicos tem permitido uma extrema volatilidade dos caudais recebidos de Espanha que prejudica os ecossistemas e os usos da água, nomeadamente, os usos agrícolas, constituindo um incumprimento da Diretiva Quadro da Água - documento de orientação nº 31 – Caudais ecológicos na implementação da Diretiva Quadro da Água.
Mediante as considerações supra, o proTEJO requere ao Senhor Ministro do Ambiente e da Ação Climática, Duarte Cordeiro, o seguinte:
a) Que Portugal exija a avaliação dos impactos transfronteiriços do projeto de instalação no rio Tejo, de uma hidroelétrica reversível na barragem de Alcântara e que manifeste a sua oposição ao projeto junto do Governo de Espanha enquanto não for assegurada a implementação do regime de caudais ecológicos, conforme regulado e previsto na Convenção de Albufeira e em cumprimento dos objetivos da Diretiva Quadro da Água e na Recomendação EC 2015 (Ecological flows in the implementation of the Water Framework Directive. Guidance document).
b) Que sejam definidos cientificamente os caudais ecológicos a integrar nos Planos de Gestão da Região Hidrográfica do Tejo – 2022/2027 por Portugal e Espanha nos pontos de controlo que atualmente estão presentes na Convenção de Albufeira, em Cedillo e Ponte de Muge.
Bacia do Tejo, 13 de dezembro de 2022
Os Porta-Vozes do proTEJO,
Ana Silva e Paulo Constantino
Mais informação: Paulo Constantino - +351919061330
Anexos
Anexo nº 1 - “APROVECHAMIENTO HIDROELECTRICO DE ALCANTARA II DE 440 MW EN T.M. ALCANTARA (CACERES)”
[1] Anúncio da Área de Indústria e Energia da Delegação do Governo da Extremadura, mediante o qual é submetido a informação pública o pedido de autorização administrativa prévia e declaração de impacte ambiental do anteprojeto de execução de uma central de bombagem hidráulica denominada "José María de Oriol II" de 440 MW e sua infraestrutura de evacuação, no município de Alcântara, província de Cáceres. – Boletim Oficial da Província de Cáceres Anúncio BOP-2022-5821 de 29/11/2022, BOP Nº 233 - https://bop.dip-caceres.es/bop/services/anuncios/contenidoPdfIdAnuncio?csv=BOP-2022-5821.
[2] “APROVEITAMENTO HIDRELÉTRICO DE ALCÂNTARA II DE 440 MW EM T.M. ALCÂNTARA (CÁCERES)”; Corpo substantivo: D.G. DO MINISTÉRIO DE POLÍTICA DE ENERGIA E MINAS PARA A TRANSIÇÃO ECOLÓGICA E O DESAFIO DEMOGRÁFICO; Promotor: IBERDROLA GENERACION S.A.
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CAIXA
CONVENÇÃO DE ALBUFEIRA
Artigo 9.º
Avaliação de impactes transfronteiriços
As Partes adoptam as disposições necessárias para que os projectos e as actividades objecto desta Convenção que, em função da sua natureza, dimensão e localização, devam ser submetidos a avaliação de impacte transfronteiriço, o sejam antes da sua aprovação. As Partes também adoptam as medidas adequadas para aplicar os princípios de avaliação de impacte transfronteiriço aos planos e programas relativos às actividades previstas no número 2 do artigo 3º.
As Partes, no seio da Comissão, identificam os projectos e actividades que, em função da sua natureza, dimensões e localização, devem ser sujeitas a avaliação de impacte transfronteiriço, assim como os procedimentos para a realização dessa avaliação.
Até que se adopte o acordo previsto no número anterior, os projectos e actividades que devem ser submetidos a avaliação de impacte transfronteiriço, assim como os procedimentos que devem basear essa avaliação, são os que constam do Anexo II.
As Partes, no seio da Comissão, determinam quais os projectos e as actividades que, sendo susceptíveis de provocar impactes transfronteiriços, e em função da sua natureza, dimensão e localização, devem ser sujeitos a monitorização dos seus efeitos, bem como as condições e alcance dessa monitorização.
Anexo II - Impacte Transfronteiriço
1 - Na avaliação de impacte transfronteiriço, cada Parte tem em conta as disposições das Directivas comunitárias relativas à avaliação de impacte ambiental, em particular as Directivas 85/337/CEE e 97/11/CE, e suas alterações, bem como as normas de direito internacional vigente entre as Partes. A avaliação de impacte transfronteiriço decorre de acordo com as normas internas de avaliação de impacte ambiental e é apreciada pela autoridade competente da Parte em cujo território se localiza o projecto ou a actividade que causa ou é susceptível de causar o impacte, mantendo a outra Parte permanentemente informada do decurso desse procedimento.
2 - No início do procedimento de avaliação de impacte transfronteiriço, as Partes, no seio da Comissão, definem um prazo razoável, não inferior a dois meses, para a realização do mesmo, sempre que esse prazo não se encontre fixado na legislação nacional aplicável.
3 - Os projectos ou actividades previstos no número 4 do presente Anexo, e respectivas ampliações, são submetidos a avaliação de impacte transfronteiriço, desde que se verifique uma das seguintes condições:
a) a distância ao troço fronteiriço seja inferior a 100 km, medida segundo a rede hidrográfica, para montante ou jusante, salvo indicação expressa em contrário;
b) causem, por si mesmos ou por acumulação com os existentes, uma alteração significativa do regime de caudais;
c) causem descargas que contenham alguma das substâncias poluentes referidas no número 8 do Anexo I;
4- Os projectos e actividades referidos no número 3 são os seguintes:
a) Instalações industriais de produção de energia ou mineiras susceptíveis de originar um impacte ambiental sobre as águas transfronteiriças;
b) Condutas para transporte de produtos petrolíferos ou químicos em função da sua capacidade e da distância de propagação potencial até à fronteira;
c) Instalações para o armazenamento de produtos perigosos, incluindo os radioactivos, e para eliminação de resíduos, em função da sua capacidade e da distância de propagação potencial até à fronteira;
d) Albufeiras de regularização e para armazenamento da água, em função da sua capacidade e da distância à fronteira, medida ao longo da rede hidrográfica, de acordo com a seguinte tabela:
Distância à fronteira (km) | < 1 | 1 a 10 | 10 a 50 | > 50 |
Capacidade (hm3) | > 0,1 | > 5 | > 25 | > 100 |
e) Regularização e canalização de leitos fluviais com mais de 1000 m de comprimento, desde que se localize nos rios transfronteiriços ou nos seus afluentes directos, a uma distância inferior a 10 km da fronteira medida ao longo da rede hidrográfica.
f) Captações de água superficial, independentemente do seu uso ou destino, inclusive exterior à bacia hidrográfica, quando o consumo efectivo mínimo exceda os valores seguintes:
Bacia Hidrográfica | Minho | Lima* | Douro | Tejo | Guadiana |
Consumo efectivo (hm3) | > 100 | > 20 | > 150 | > 100 | > 40 |
* em toda a bacia hidrográfica
e em qualquer caso sempre que se trate de transferência de águas para outra bacia hidrográfica em volume que exceda 5 hm3/ano.
g) Captações brutas de águas subterrâneas, independentemente do seu uso ou destino, inclusive exterior à bacia hidrográfica, tanto em captações individuais como em campos de furos, com exploração unitária superior a 10 hm3/ano;
h) Recargas artificiais de equíferos com volumes superiores a 10 hm3/ano;
i) Instalações de tratamento de águas residuais com capacidade superior a 150.000 habitantes equivalentes;
j) Descargas de águas residuais ou contaminadas, de origem urbana, industrial, agrícola, pecuária ou de outro tipo, em que a carga contaminante seja superior a 2000 habitantes equivalentes, situados a uma distância inferior a 10 km da fronteira, medida ao longo da rede hidrográfica;
l) Utilização de água para refrigeração que origine um aumento da temperatura da água superior a 3.º C, no meio hídrico;
m) Trabalhos de deflorestação e que afectem uma área superior a 500 ha.
CAIXA
CAUDAIS DO RIO TEJO
Portugal recebe 63% da disponibilidade hídrica da bacia espanhola, 5.500 hm3 por ano, o dobro do caudal anual previsto na Convenção de Albufeira e Espanha apenas não cumpriu por 10% o caudal mínimo anual no ano hidrológico de 2021/2022, demonstrando que o caudal mínimo anual é de ano de seca.
A assinatura da Convenção de Albufeira subdeterminou os caudais do Tejo comparativamente aos do Douro, visto que as bacias do Tejo e do Douro têm a mesma disponibilidade hídrica em Espanha, cerca de 9.000 hm3, sendo os caudais mínimos anuais de 2.700 hm3, no Tejo, e de 3.500 hm3, no Douro (- 800 hm3).
Por outro lado, o transvase Tejo Segura tem afetos 1.000 hm3 da água que pertence ao regime natural do rio Tejo, tendo usado um máximo de 500 hm3 e atualmente cerca de 200 hm3, pelo que 800 hm3 do regime natural do rio Tejo está a ser usado pelas hidroelétricas sem justificação.