Exmo. Senhor Ministro do Ambiente e Transição Energética
Eng.º João Pedro Matos Fernandes,
O proTEJO – Movimento pelo Tejo vem por este meio solicitar esclarecimentos quanto às causas do vazamento das barragens espanholas de Cedillo e de Alcântara com consequências negativas a nível ambiental nas respetivas albufeiras e nos rios Pônsul e Sever que confluem na albufeira de Cedillo, bem como prejuízos nas atividades económicas turísticas e piscatórias, como pode observar no vídeo da seguinte ligação (ver aqui).
Constatou-se, da consulta ao Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos da Agência Portuguesa do Ambiente, que os caudais médios diários que afluem a Portugal desde Junho até à presente data apresentam níveis significativamente elevados com volumes idênticos aos mais elevados verificados no inverno, em Dezembro e Janeiro, atingindo os seus máximos no corrente mês de setembro.
Além disso, os dados dos níveis de armazenamento das barragens de Cedillo e Alcântara permitiram verificar que, durante o mês de setembro, estas barragens procederam as descargas de água volumosas:
a) desde o início de setembro e até ao dia 9 de setembro, o nível de armazenamento reduziu-se 109 hm3 em Alcântara e 53 hm3 em Cedillo;
b) nas duas semanas de 9 a 23 de setembro as barragens de Alcântara e Cedillo descarregaram cerca de 150 hm3, cada uma;
c) nos dias 12 e 13 de setembro registaram-se também significativas descargas de água com Alcântara a descarregar 36 hm3 e Cedillo a descarregar 12,5 hm3.
Este comportamento de vazamento das barragens de Alcântara e Cedillo é contraditório com as reduzidas disponibilidades de água verificadas neste período, significativamente inferiores ao registado em 2017 e à média dos últimos 10 anos, registando 47,18% em Alcântara e 75,38% em Cedillo, e paralelamente a um balanço hídrico negativo em termos de precipitação, evapotranspiração e humidade do solo, e com o facto de Espanha apenas estar obrigada ao envio de 7 hm3 por semana, nos termos da Convenção de Albufeira.
Não entendemos que a falta de água nas barragens de Alcântara e Cedillo, bem como nos rios Sever e Pônsul resulte de descargas com a finalidade de Espanha garantir o cumprimento da Convenção de Albufeira.
Com efeito, em maio do ano corrente o nível de armazenamento daquelas barragens era ligeiramente superior ao registado em 2017, na mesma semana, e não consta que nesse ano não tenha sido cumprida a Convenção de Albufeira.
No ano de 2017, ao invés das enormes descargas registadas este ano desde o mês de junho, foi realizada uma gestão mais criteriosa e regular dos caudais que permitiu chegar a novembro com níveis de armazenamento nas barragens de Alcântara e Cedillo iguais à média dos últimos 10 anos ao mesmo tempo que Espanha cumpria os regimes de caudais previstos na Convenção de Albufeira, provando assim que tal meta também seria possível de alcançar no ano corrente.
Relembramos ainda que 2018 foi um ano de muita precipitação, o que permitiu entrar no ano hidrológico de 2018/2019 com níveis de armazenamento ligeiramente superiores à média dos últimos 10 anos.
Conclui-se assim que a situação criada era evitável e não havia nenhuma necessidade dela.
Por outro lado, a enorme quantidade de água que tem vindo a chegar a Portugal e que tem permitido manter caudais significativos no rio Tejo apenas veio demonstrar que a água que existe nas barragens da Estremadura espanhola é suficiente para fornecer verdadeiros caudais ecológicos de forma regular e estável ao longo do tempo e considerando as variações naturais e sazonais do fluxo.
Apenas tem faltado iniciativa e vontade de negociação entre o estado português e o estado espanhol para proceder a uma eficaz aplicação da Convenção de Albufeira e ao estabelecimento de regras de gestão das reservas de água pelas barragens portuguesas e espanholas com vista a assegurar um adequado regime de caudais ecológicos e, consequentemente, o bom estado ecológico do rio Tejo.
Com a finalidade de conhecer os impactes da falta de água na barragem de Cedillo, bem como nos rios Sever e Pônsul, o proTEJO deslocou uma delegação ao rio Pônsul, mais propriamente ao caís fluvial dos Lentiscais, no Concelho de Castelo Branco, onde se foram trocadas impressões com mais de cinquenta cidadãos e associações, e se verificou que o rio vazou mais de uma dezena de metros, encontrando-se transformado num riacho com cheiro a lamas, no qual existe risco de ocorrência de uma mortandade de peixes que se encontram acumulados em poças, onde o ancoradouro de embarcações turísticas está pendurado na margem muitos metros acima do nível da água.
Na troca de impressões com pescadores, operadores turísticos e outros empresários que operam na zona do Tejo Internacional foi-nos transmitido que lhes é exigido o cumprimento de inúmeras responsabilidades, de caráter ambiental e outras, e que consideram que não estão a usufruir dos direitos das licenças que pagaram para o exercício das suas atividades, para além de não entenderem o motivo pelo qual não foram oportunamente informados do vazamento das barragens de modo a que pudessem adotar medidas que minimizassem os prejuízos que estão agora a acumular diariamente. Estes empresários locais manifestaram ainda especial preocupação com a possibilidade de manutenção desta situação durante as próximas semanas visto que as suas empresas assentam em atividades dependentes do rio Pônsul.
Tendo em vista transmitir a preocupação de quem vive do rio e obter os necessários esclarecimentos dirigimo-nos à delegação da Agencia Portuguesa do Ambiente de Castelo Branco que informou estarem a fazer o acompanhamento da situação e que em breve iriam emitir um comunicado, tendo o proTEJO sugerido a celeridade nesse procedimento informativo, e também à Câmara Municipal de Castelo Branco que manifestou também estar a ser lesada com o ocorrido e que ainda aguardavam esclarecimentos por parte das autoridades competentes.
Também na barragem do Fratel, já no distrito de Portalegre, o cais encontrava-se pendurado a mais de uma dúzia de metros acima de um nível de água anormalmente baixo e a embarcação turística encontrava-se ancorada no meio do rio Tejo, a que se somavam vários barcos encravados na lama e outros pendurados por cordas nas margens, numa paisagem desoladora.
Neste momento, a nossa preocupação centra-se no modo como vai ocorrer a reposição a níveis de armazenamento anteriores, que não poderá ocorrer com uma redução exagerada das descargas tendo em vista um enchimento mais rápido da barragem de Cedillo uma vez que esse procedimento iria por certo afetar o nível de armazenamento da barragem do Fratel e o nível de caudais do rio Tejo a jusante.
Em termos conclusivos, constata-se que as intensas descargas registadas não tiveram como finalidade cumprir a Convenção de Albufeira e que é notória uma inadequada gestão das reservas de água pelas barragens espanholas que está a causar enormes prejuízos ambientais, económicos e sociais para as populações ribeirinhas do rio Pônsul e Sever, bem como para os utilizadores da barragem de Cedillo.
Face ao exposto o proTEJO vem junto de V. Ex.ª:
1. Solicitar o esclarecimento quanto ao motivo que levou ao vazamento das barragens espanholas de Alcântara e Cedillo, que está na origem da falta de água nos rios Pônsul e Sever;
2. Propor a articulação do Governo português e espanhol tendo em vista, com caráter de urgência, encontrar uma solução equilibrada para ultrapassar o problema de falta de água na barragem de Cedillo, bem como nos rios Sever e Pônsul;
3. Requerer uma eficaz aplicação da Convenção de Albufeira e a regulamentação de uma adequada gestão das reservas de água pelas barragens portuguesas e espanholas com vista a assegurar um adequado regime de caudais ecológicos e, consequentemente, o bom estado ecológico do rio Tejo.
Atenciosamente,
Ana Brazão e Paulo Constantino
(Os porta vozes do proTEJO)