quarta-feira, 23 de outubro de 2024

O Movimento proTEJO responsabiliza a Senhora Ministra do Ambiente e Energia pelo desperdício de uma oportunidade única de impor à Iberdrola o cumprimento de um regime de caudais ecológicos no rio Tejo

Nota de Imprensa

23 de outubro de 2024

“O Movimento proTEJO responsabiliza a Senhora Ministra do Ambiente e Energia pelo desperdício de uma oportunidade única de impor à Iberdrola o cumprimento de um regime de caudais ecológicos no rio Tejo”

O Movimento proTEJO responsabiliza a Senhora Ministra do Ambiente e Energia pelo desperdício de uma oportunidade única de impor à Iberdrola o cumprimento de um regime de caudais ecológicos no rio Tejo em contrapartida da autorização, a esta mesma empresa, da construção de dois projetos hidroelétricos de bombagem reversível nas barragens de Alcântara e Valdecañas no rio Tejo, visto que o projeto de Alcântara necessita da autorização das autoridades portuguesas no âmbito da Convenção de Albufeira, por se localizar a menos de 100 km do território português.

A implementação destes dois projetos hidroelétricos de bombagem reversível permitirá à Iberdrola manter a água em ciclo fechado durante mais tempo gerando um enorme incremento da capacidade de armazenamento de água e de produção de energia. Por estes motivos existirá então uma razão suficiente para negociar a libertação de água necessária a um verdadeiro regime de caudais ecológicos destinados à conservação dos ecossistemas e, ainda, caudal suficiente para os usos económicos e de lazer das populações ribeirinhas.

É, portanto, lamentável, a incapacidade de impor à Iberdrola a obrigação de cumprimento de um regime de caudais ecológicos no rio Tejo e, por absurdo, a oferta à Iberdrola, a partir de hoje, sem qualquer garantia conhecida, da capacidade de fechar completamente a torneira da água do rio Tejo com origem em Espanha

Desta origem dependem as populações servidas pela albufeira do Fratel, Vila Velha de Ródão e Nisa, que enfrentarão uma situação de insegurança permanente face ao controlo total e sem garantia da Iberdrola sobre o caudal do rio Tejo.

Questionamo-nos sobre o motivo pelo qual os termos do acordo ibérico sobre gestão dos rios transfronteiriços, que vai ser assinado hoje pelo Governo português na Cimeira Ibérica que teve lugar no Palácio Fialho, em Faro, foram mantidos em segredo? Apesar dos vários e atempados pedidos de reunião, os exatos termos deste acordo não foram sequer transmitidos na sessão de auscultação do Ministério do Ambiente e Energia às organizações que o solicitaram, além do que já era conhecido por via da comunicação social, o que impediu a sua discussão prévia e a necessária transparência junto da sociedade civil.

Realçamos a agravante da assinatura de um acordo que não acolhe nenhuma das quatro posições apresentadas, na sessão de auscultação do Ministério do Ambiente e Energia, pelos seis movimentos cívicos em defesa dos rios e da água (AMORA, Mondego Vivo, #MovRioDouro, MUNDA, PAS e proTEJO).

Os caudais mínimos diários, que a comunicação social anunciou que constarão do chamado “aprofundamento” do regime provisório de caudais mínimos que há 25 anos foram estabelecidos na Convenção de Albufeira, não resolvem o problema de enorme volatilidade dos caudais do rio Tejo com origem em Espanha, não permitem a conservação dos ecossistemas em todo curso do rio Tejo, nem garantem a penalização da Iberdrola pela ocorrência de caudais nulos no rio Tejo.

Importa que seja clarificado que um verdadeiro regime de caudais ecológicos determinados por métodos científicos, não se coaduna com a proposta de caudais mínimos diários fazendo simplesmente a divisão dos atuais 7 hm3 de caudal mínimo semanal pelos 7 dias das semanas, ou seja, 1 hm3 por dia a serem largados à hora que a Iberdrola muito bem deseje.

Este conceito repete a fórmula absurda acordada em 2017, entre o Governo português e a concessionária hidroelétrica EDP que fixou um caudal mínimo diário na barragem de Belver de cerca de 0,864 hm3[1] que se alcançam turbinando 30 m3/s de água em dois períodos de 4 horas, sendo que durante as restantes 16 horas do dia podem manter-se caudais nulos. Demonstrando-se assim que um caudal diário não é um verdadeiro caudal ecológico, contínuo e instantâneo, mas apenas um caudal mínimo com o objetivo de servir principalmente a produção de energia.

Não é compreensível a razão pela qual se continuam a fixar caudais mínimos, política e administrativamente, sejam eles diários, semanais, trimestrais ou anuais, enquanto se mantém suspenso o articulado principal da Convenção de Albufeira, no seu artigo 16º, que estabelece a necessidade de implementação dos caudais necessários à conservação dos ecossistemas e do bom estado ecológico das massas de água, vigorando transitoriamente um regime de caudais mínimos constantes do protocolo adicional a esta Convenção, em incumprimento da Diretiva Quadro da Água.

O regime de caudais ecológicos, que pretendemos ver implementados definitivamente, são aqueles que verdadeiramente permitem a conservação dos ecossistemas e o bom estado ecológico das águas e que, sendo instantâneos e contínuos, evitam por essa via a enorme volatilidade de caudais que hoje se verifica e prejudica os ecossistemas, as atividades económicas e o usufruto do rio pelas populações.

Apesar desta cedência do Governo português, retumbante e sem precedentes, o proTEJO irá encontrar-se com os representantes da Comissão Europeia, em Lisboa, com o objetivo de transmitir a urgência da apreciação da nossa denúncia à Comissão Europeia devido ao “Incumprimento da Diretiva Quadro da Água pela não implementação de um regime de caudais ecológicos por Espanha e Portugal”, já subscrita por um conjunto de 31 organizações portuguesas, espanholas e europeias, ambientalistas, sociais, culturais e autarquias, e que a defesa da implementação de um regime de caudais ecológicos já foi acompanhada pelas comunidades intermunicipais do Médio Tejo, Lezíria do Tejo e Beira Baixa, faltando a solidariedade da Área Metropolitana de Lisboa (AML) e dos seus municípios para com aqueles situados a montante do rio Tejo.

Mantemos assim a defesa de um regime de caudais ecológicos na barragem de Cedillo no rio Tejo, determinados cientificamente nos Planos de Gestão da Região Hidrográfica de Portugal e Espanha, com a coordenação das administrações de Portugal e Espanha, dando cumprimento à Diretiva Quadro da Água e ao direito europeu, em conformidade com a legislação nacional de Portugal e Espanha e com a própria Convenção de Albufeira celebrada entre Portugal e Espanha.

Bacia do Tejo, 23 de outubro de 2024

Ana Silva e Paulo Constantino

Os Porta-Vozes do proTEJO

Mais informação: Paulo Constantino +351 919 06 13 30

 

Caixa

Conceito de regime de caudais ecológicos atualmente em vigor no Plano Nacional da Água 2002

 

“regime de caudais necessário para garantir o bom estado das águas, no sentido de minimizar os impactes sobre os ecossistemas dulçaquícolas a jusante dos aproveitamentos hidráulicos, que permitam assegurar: a conservação e manutenção dos ecossistemas aquáticos naturais; a reprodução das espécies; a conservação e manutenção dos ecossistemas ripícolas; e os aspetos estéticos da paisagem ou outros de interesse científico e cultural” especificando-se:

a)      Caudais instantâneos, definidos à escala mensal, que variam ao longo dos anos para atender às necessidades das espécies aquáticas;

b)     Flexível em função das condições hidrológicas naturais que se verificam em cada ano, em particular em anos secos, devendo ser definidos regimes de caudais ecológicos para anos secos e para anos médio e húmidos;

c)     Caudais de cheia para:

            i. Remoção de materiais finos depositados e prevenção do crescimento da vegetação;

                     ii. Manutenção da estrutura do leito e das secções transversais;

                 iii. Manutenção da zona ripária, leito de cheia, características do vale e nível freático;

             iv. Manutenção dos ecossistemas associados aos cursos de água, tais como zonas húmidas e estuários.

 

 [1] “Em concreto, foi estabelecido que o volume de água afluente a Belver seja turbinado, em dois períodos de 4 horas, fixando também um caudal mínimo diário de 10 m3/s, o que é equivalente a um volume diário de 0,864 hm3 para jusante.” Vide Caudais do rio Tejo 30-07-2021 - XXII Governo - República Portuguesa.

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