CARTA CONTRA A INDIFERENÇA
RIO NABÃO - TOMAR – 17 DE JULHO DE 2021
O rio Nabão
não é apenas água, é cultura viva, a espinha dorsal e o eixo, das terras e das
aldeias por onde passa.
É com grande
felicidade que vemos juntarem-se em defesa do rio Nabão todos os cidadãos e
organizações aqui presentes, representativos de toda a bacia ibérica do Tejo e
de todos os sectores da sociedade e áreas de ação, constituindo-se como um
exemplo independente de participação e cidadania.
Nas nossas
diferenças, o elo que nos une são os rios da bacia do Tejo!
Esta bacia do
Tejo de Espanha a Portugal, que une todas as populações ribeirinhas e as suas
culturas, que a conhecemos e a vivemos da nascente até à foz dos seus rios e
afluentes, de Albarracín ao Grande Estuário.
É também
significativo que nos encontremos aqui neste encantador mouchão de Tomar onde
se pretende realçar a beleza do património natural do rio Nabão, que flui desde
a sua nascente para vir banhar a praia fluvial do Sobreirinho e atravessar o
município e a cidade de Tomar, de onde prossegue até desaguar no rio Zêzere e
por fim chegar ao rio Tejo.
Todos estes
afluentes e subafluentes que confluem para o rio Tejo ao longo do seu curso sustentaram
as atividades agrícolas e comerciais das suas gentes e constituíram-se como o
principal eixo de desenvolvimento das comunidades ribeirinhas: agricultores,
moleiros, construtores de barcos, artes de pesca, barqueiros, pescadores.
Destes teimam uns poucos em tirar dos rios o sustento, cada dia mais magro em
resultado da degradação dos ecossistemas e consequentes alterações na
biodiversidade, causada pelos desmandos do ser humano.
As populações
da bacia do Tejo sempre conseguiram sobreviver e prosperar em harmonia com os
rios, que lhes foram generosos no passado e que serão essenciais no futuro.
Um futuro onde
o laço de natureza e cultura perdure e se reforce com o regresso de modos de
vida ligados à água e ao rio, assente num desenvolvimento sustentável de atividades
agrícolas e industriais responsáveis, de educação e turismo de natureza,
cultural e ambiental, que apenas será possível se unirmos esforços para a
preservação dos rios Vivos sem poluição e Livres de açudes e barragens para
assegurar a conservação dos ecossistemas e habitats aquáticos, o usufruto do
rio pelas populações ribeirinhas e os fluxos migratórios das espécies
piscícolas.
É sabido que o
rio Nabão e muitos outros afluentes do Tejo têm vindo a sofrer uma continuada
poluição que mata os peixes, envenena o ambiente e afeta a saúde das pessoas,
com origem na falta de tratamento de águas residuais urbanas e de descargas de
efluentes não tratados da agricultura, indústria, suinicultura, entre outras.
São graves as implicações
da poluição na qualidade das águas destinada para a rega dos campos, a pesca, a
biodiversidade, a saúde das pessoas e o aproveitamento do potencial da região
ribeirinha para práticas de lazer, de turismo fluvial e de desportos náuticos
com respeito pelo estado ecológico da bacia hidrográfica do Tejo.
Também é grave
que esta poluição ocorra com desrespeito pelas leis em vigor e sem a competente
vigilância e controlo das autoridades responsáveis, valendo a ação de denúncia
das organizações ecologistas e dos cidadãos, por diversas formas, nomeadamente,
através das redes sociais e da comunicação social.
A despoluição
do rio Nabão e a preservação ecológica dos rios é um tributo que os cidadãos
devem oferecer para a sustentabilidade da Vida e para a conservação do seu
património, sendo hoje urgente defender rios Vivos sem poluição e Livres com
dinâmica fluvial de modo a garantir: a qualidade das massas de água superficiais
e subterrâneas; a conservação dos ecossistemas, dos habitats e da
biodiversidade; o estabelecimento de verdadeiros caudais ecológicos; a rejeição
dos projetos de construção de novos açudes e barragens e a exigência de uma regulamentação
adequada para as barreiras que já existem; um regime fluvial adequado à
migração e reprodução das espécies piscícolas; e uma conectividade fluvial proporcionada
por eficazes passagens para peixes e pequenas embarcações.
Continuaremos
a combater a sobre exploração da água do Tejo que já existe face à gestão
economicista das barragens hidroelétricas da estremadura espanhola, aos
transvases da água do Tejo para a agricultura intensiva no sul de Espanha e à
agressão da poluição agrícola, industrial e nuclear.
Conhecemos os
males de que os rios padecem e o maltrato que a mão dos humanos tem vindo a
infligir à sua água e aos seus ecossistemas.
Para conter
essa mão que o maltrata temos que abrir a outra mão para que o proteja, e essa
mão somos nós!
Por isso temos
o dever de estender essa mão aberta para criar uma corrente de vontade e de
intencionalidade, que seja capaz de esclarecer quem decide e que exija um
tratamento ecologicamente sustentável para os rios.
Devemo-lo a
nós próprios, que com os rios partilhámos a nossa vida e aceitámos a
generosidade das suas águas.
Devemo-lo às
gerações futuras para que conheçam rios Vivos e Livres, como nós os conhecemos,
e não escravos e prisioneiros do egoísmo, da especulação, da ganância e da irresponsabilidade
dos humanos.
Se
continuarmos neste rumo, as próximas gerações já não conhecerão rios Vivos e
Livres, mas apenas imagens na internet... que serão sombras do que um dia nos
foi oferecido com generosidade, e não terão incentivo a reconhecer o valor
destes rios de que nunca tiveram a possibilidade de desfrutar.
Por tudo isto,
devemos unir-nos e reclamar a defesa da qualidade da água do rio Nabão e dos
rios da bacia do Tejo, bem como da quantidade de água e a rejeição ou remoção
das barreiras à sua conectividade, para que sejam saudáveis e forneçam os
serviços ecológicos necessários à Vida no seu conjunto biodiverso e se
mantenham como referência do Património ribeirinho.
Devemos ainda
unir-nos e reclamar a unidade e integridade dos rios e da sua bacia, já que o
amor e o respeito que por ele sentimos não se esgotam em nenhuma das fronteiras
administrativas e artificiais que os homens impõem à natureza.
Para que as
nossas mãos os protejam temos que as unir e coordenar, mostrando a união dos
cidadãos e cidadãs portugueses e espanhóis na defesa dos rios da bacia do Tejo,
enquanto bacia ibérica internacional, e afirmar a nossa determinação para
combater a indiferença ao maltrato que têm vindo a sofrer.
Assim, com
vista a defender o rio Nabão e como cidadãos da bacia do Tejo, em Portugal e em
Espanha, unimo-nos para reivindicar a todas as autoridades competentes,
internacionais, nacionais, regionais e locais:
1º. A
necessidade de uma gestão sustentável da bacia hidrográfica do Tejo com base no
princípio da unidade da sua gestão;
2º. O
cumprimento da Diretiva Quadro da Água, nomeadamente a garantia de um bom
estado das águas do rio Nabão;
3º. O acompanhamento,
monitorização e verificação do cumprimento das licenças de descargas de
efluentes das ETAR urbanas, industriais, exigindo a tomada de medidas de
proteção ambiental com base no princípio da precaução;
4º. O
desbloqueamento da execução das medidas que se sabe serem necessárias para
eliminar os focos de poluição no rio Nabão, informando os cidadãos do planeamento
da execução, nomeadamente, da sua exequibilidade temporal.
É isto que
defendemos,
Que as nossas
mãos unidas protejam os rios Nabão e a bacia do Tejo.
E digamos com
Miguel Torga, porque os poetas sabem ver o futuro
Recomeça
Se puderes,
Sem angústia e
sem pressa.
E os passos
que deres
Nesse caminho
duro
Do futuro
Dá-os em
liberdade.
Enquanto não
alcances
Não descanses.
O Nabão merece!
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