NOTA DE IMPRENSA
4 de julho de 2023
“Os movimentos em defesa das bacias do Douro,
do Tejo e do Guadiana
opõem-se ao transvase da bacia do Douro-Tejo-Guadiana-Sado do lobby do
regadio, que perverte o “princípio de unidade de gestão da bacia hidrográfica”
estabelecido na Diretiva Quadro da Água”
Os
movimentos em defesa das bacias do Douro, do Tejo e do Guadiana opõem-se ao transvase
que integraria as bacias hidrográficas do Douro, do Tejo, do Guadiana e do Sado para transportar água do Minho para o Algarve, mais concretamente com destino à albufeira do Alqueva gerida
pela empresa EDIA, que o lobby constituído em torno do regadio, apelida de
“autoestrada da água” uma vez que pretende perverter o “princípio de unidade de
gestão das bacia hidrográfica” estabelecido na Diretiva Quadro da Água, segundo
o qual cada bacia deve bastar-se a si própria gerindo as suas pressões e
necessidades de água considerando as suas próprias disponibilidades de água.
Ademais
esta proposta assenta na desconsideração pelas funções sociais e ecológicas da
água, aprofundando uma visão estritamente mercantil deste recurso que contraria
todo o conhecimento científico acumulado.
Um
transvase de água gera uma nova pressão de procura de água na bacia cedente,
neste caso a bacia do Douro, para alimentar a bacia recetora, a albufeira do
Alqueva no Guadiana, após os usos que forem atribuídos à bacia do Tejo.
Este
projeto de transvase de água criará uma ilusória sensação de abundância de água
na bacia de recetora de água gerando um ciclo vicioso de aumento de procura e
consumo de água que não existe no local onde está a ser consumida, estabelecendo
novas pressões quantitativas e qualitativas, bem como uma necessidade
permanente de abastecimento a partir da bacia cedente (Douro) ainda que não
existam condições para o suportar, podendo gerar conflitos sociais e económicos
com expressão regional entre bacias cedentes e recetoras.
Aliás,
é falso que a bacia do Douro seja excedentária. Em 2022 atingiu, em metade da
sua extensão, a seca extrema e, neste momento, o setor superior atingiu na sua
totalidade a seca severa e o índice de água no solo é já inferior a 10%.
Temos
flagrantes exemplos mal sucedidos como as autoestradas da água na Califórnia ou
o transvase Tejo-Segura que transfere água da cabeceira do Tejo em Espanha para
a zona do Levante no sul, a partir da Comunidade Autónoma de Castilla La Mancha
para a Comunidade Autónoma de Murcia, que impediu a existência de caudais
ecológicos suficientes no troço do médio Tejo em Espanha, durante décadas, mas que
estão agora a ser impostos pelo Supremo Tribunal espanhol em detrimento dos transvases
para o sul de Espanha, em cumprimento da legislação espanhola e da Diretiva
Quadro da Água. Isto após longas décadas de conflitos político-sociais entre as
regiões da bacia cedente e recetora, respetivamente, a Comunidade Autónoma de
Castilla e a Comunidade Autónoma de Múrcia.
Não
queiramos importar para Portugal os maus exemplos dos nossos vizinhos,
especialmente quando estes nossos vizinhos, também amigos do lobby com um
variado leque de interesses ligados à promoção do regadio (fundos de investimento
focados no imobiliário, betão, consultoria, agro-negócio…), estão a estabelecer-se
nos territórios servidos pela albufeira do Alqueva para usarem até à exaustão o
seu solo e a sua água.
Os
mentores e promotores desta “autoestrada da água” são os mesmos que pretendem
construir novos açudes (4) e barragens (2) no rio Tejo de Abrantes a Lisboa
transformando em charcos de água estagnada os seus últimos 127 km de rio vivo e
livre, fragmentando habitats, piorando a qualidade da água e destruindo
ecossistemas fundamentais à sobrevivência das espécies, incluindo a humana,
sendo de relevar os desequilíbrios ecológicos irreversíveis que serão causados
no estuário do Tejo.
Tudo
isto para manter e aumentar a área de agricultura superintensiva, absolutamente
insustentável no Alentejo.
A
desadequação do perfil de consumos agrícolas face às disponibilidades presentes
e face às previsões de redução de precipitação é uma realidade com consequências
gravosas para as bacias do Sul do país e para as populações que delas dependem.
No caso do rio Mira e da barragem de Santa Clara esse consumo agrícola
desligado da realidade hidrológicas tem acentuado uma tendência de redução
inédita das disponibilidades daquela albufeira. Os níveis críticos em que se
encontra barragem têm motivado tensões sociais e institucionais crescentes e
medida urgentes para conter a delapidação dos recursos hídricos da região.
As
soluções com futuro para a agricultura deverão estar focadas na mudança de
práticas agrícolas, na adaptação das culturas à realidade hidrológica e climática
com práticas que regenerem os solos, mais eficientes no uso e conservação da
água e que beneficiem a biodiversidade cuja ação global assegura o bom
funcionamento dos ciclos ecológicos, vitais para alimentar a Cadeia da Vida em
todas as suas dimensões.
No setor
agrícola, a redução de desperdício de água (perdas, distribuição, etc..)
acrescida da eficiência hídrica no uso da água permitiria poupar 40% da água,
ou seja, a agricultura conseguiria produzir o mesmo que hoje produz com cerca
de metade da água que capta hoje em dia. Além do mais, a ausência de
fiscalização e de instrumentos de medição leva a que pouco mais de 10% da água
na agricultura seja efetivamente faturada, não se repercutindo os custos sobre
os utilizadores.
Mas
não podemos ficar por aqui, teremos que apostar numa boa gestão dos recursos
hídricos disponíveis, tendo em conta a urgência de alcançar o bom estado
ecológico das massas de água, utilizando com parcimónia apenas aquilo que for
essencial e fundamental para a sociedade considerada no seu todo, preservando a
identidade cultural e social das diversas regiões.
Considera-se
ainda fundamental a realização de um debate na sociedade centrado no uso
sustentável da água, enquanto recurso escasso, uma análise aprofundada da
capacidade de carga para o regadio, um estudo das necessidades objetivas para
consumos; e, fundamental, a implementação de verdadeiros caudais ecológicos no
âmbito da Convenção de Albufeira, em cumprimento da Diretiva Quadro da Água e
do seu “princípio de unidade de gestão da bacia hidrográfica”.
Importa
assim tomar medidas para inverter a enorme transformação dos territórios, nos
perímetros de rega e fora destes, com impactes geradores de desordenamento do
território, de degradação da rede hidrográfica, de erosão do solo e de perda de
biodiversidade, de exploração laboral e de concentração da posse e do uso do
solo e da água. Salientamos a importância do envolvimento das populações nos
processos de base territorial de uso dos seus recursos, tendo as ONG comunicado
recentemente à Senhora Ministra da Agricultura e Alimentação que: “O processo
de definição estratégica do regadio não pode ser encarado de forma
exclusivamente sectorial sendo depois declarado o seu interesse público com
base em supostos contributos para desenvolvimento rural. Não existe
desenvolvimento sem envolvimento, pelo que têm de existir espaços para a
discussão e construção conjunta, com atores institucionais e partes
interessadas que vão para além das diretamente beneficiadas. É essencial um
envolvimento imediato e consequente, através de processos de base territorial,
cruciais nos territórios susceptíveis à desertificação e à seca”.
Queremos
rios vivos e livres com água para a Vida!
Agricultura
sustentável, viva e vivida!
Biodiversidade
florescente!
Queremos
Vida nas nossas Vidas!
Bacia
do Douro, Tejo, Guadiana e Sado, 4 de julho de 2023
Juntos
pelo Sudoeste
MovRioDouro
- Movimento de cidadania em defesa dos rios da bacia hidrográfica do Douro
Plataforma
Água Sustentável
proTEJO
– Movimento pelo Tejo
Mais informações: Paulo Constantino – 919061330 / Rui Cortes – 919562635